quinta-feira, 22 de novembro de 2018

Uma atitude de pesquisa

O cientista social alimenta-se da heterogeneidade, adota uma escuta aberta e conceitualmente crítica frente ao pluralismo dos mundos sociais. O fechamento e a introspecção são contraproducentes para quem faz análise política e sociocultural. Saber escutar a multidão, situando-se com ela na relação com o múltiplo, com as práticas de sentido, é a tarefa primeira da compreensão sociológica. E a compreensão é mais relevante do que qualquer forma de conhecimento. Os atores sociais podem ser inovadores. Mais inovadores do que os cientistas sociais. É preciso estar atento.

quinta-feira, 24 de maio de 2018

Solidariedade intelectual

A competição mediocriza gerando atitude arrogante não condizente com a competência. Ao longo do tempo, foram os ambientes de solidariedade intelectual que mais me fizeram avançar na construção da compreensão e do saber. Os ambientes competitivos não apenas me levaram ao adoecimento, como também me levaram à ilusão do saber. Na competição, você acredita realmente que venceu, que se tornou superior, e isso é incrivelmente medíocre, uma atitude contrária ao espírito humano da descoberta, que exige questionamento das certezas, sejam elas quais forem, e, sobretudo, congregar saber e sabor numa mesma experiência-limite geradora. O acumulador de capital informacional passa a associar seu sucesso a uma postura vencedora. Nada mais distante da compreensão, do saber e da atitude de conhecimento.

quinta-feira, 8 de março de 2018

A tarefa da sociologia e seu método

"Sem dúvida, a constituição do objeto de pesquisa, como tal, supõe também a escolha de um aspecto. Mas uma vez que o fato social se dá, seja ele qual for, como pluralidade infinita de aspectos, uma vez que ele aparece como teia de relações a ser desembaraçada uma por uma, essa escolha não pode não se considerar como tal, não pode tomar-se como provisória e ser relegada pela análise de outros aspectos. A tarefa primeira da sociologia é, talvez, a de reconstituir a totalidade a partir da qual se pode descobrir a unidade entre a consciência subjetiva que o indivíduo tem do sistema social e a estrutura objetiva desse sistema. O sociólogo se esforça, de um lado, para recobrar e compreender a consciência espontânea do fato social, consciência que, por essência, não reflete sobre si; e, de outro lado, ele se esforça para apreender o fato em sua própria natureza, graças ao privilégio que lhe confere sua situação de observador que abdica de 'agir sobre o social' para pensá-lo. A partir daí, ele se obriga a reconciliar a verdade do dado objetivo, que sua análise lhe permite descobrir, e a certeza subjetiva daqueles que vivem esse dado" (Pierre Bourdieu).

Coisas classificadas e sistemas de classificação

A relação entre coisas classificadas e sistemas de classificação das coisas é central para a sociologia. O problema da classificação é o próprio objeto da sociologia. Ou melhor, da luta entre classes pelo poder de classificar. O reconhecimento é a questão central. A luta pelo reconhecimento. E isso põe vários autores em intercessão.

Modernidades pensadas 1

A relação entre a modernidade da produção e do controle social dos espaços forçosamente heterogêneos e, de outro lado, a modernidade do consumo e da dispersão de padrões de dependência e interação que obriguem compromissos e responsabilidades mútuas, mesmo quando hierarquizantes, é de uma tal complexidade que não há como estabelecer um vínculo entre espaço de produção e espaço de consumo que não seja de uma pressuposição recíproca. "A modernidade substitui a determinação heterônoma da posição social pela autodeterminação compulsiva e obrigatória" (Bauman). Isso me fez pensar no modo como Butler tem tentando repensar um modo de heteronomia sem sujeição como condição da luta política contemporânea contra a imposição de uma vida não passível de luto para a maioria. Como a noção de autonomia é uma versão subjetiva da noção mais ampla de soberania, seria necessário repensar a teoria do sujeito sob uma nova luz. É o que Butler faz em Relatar a si mesmo e em a Vida psíquica do poder.

Uma indagação ainda muito geral

A maioria dos membros das classes populares vive em condições tais de exploração e alienação, de imposição de condições precárias, que do ponto de vista subjetivo só resta a terra arrasada, o ressentimento e o ódio de si. Uma raiva que se descarrega de modo horizontal contra os vizinhos, contra os mais próximos e mais fracos. Ou então, é uma raiva contida, pois dirigida contra os mais fortes. Contudo, a resignação é a atitude ampla e geral. O dominado é levado a admirar aquilo que não é e aceitar seu lugar destituído, devido a uma série de falhas supostamente características de sua rede familiar e de parentesco. Os pobres discutem mais os problemas dramáticos da família do que os problemas dramáticos das classes populares em geral. A família como problema vem em primeiro lugar. Durante muito tempo, não prestei atenção a essa questão. Agora, tento mergulhar nela para entendê-la melhor. A família é para os pobres a fonte da vergonha social, com exceções que confirmam a regra. Ou a fonte do orgulho social, como no caso dos ricos e poderosos.