segunda-feira, 10 de junho de 2013

O QUE TENHO APRENDIDO COM LÉVI-STRAUSS SOBRE A HUMANIDADE E A ANTROPOLOGIA.

Para Lévi-Strauss, a principal ferramenta da antropologia é o distanciamento, ele diz que a antropologia "está condicionada pela distância". E uma das tarefas principais desse recurso ao afastamento, como forma de totalização teórica a partir das formas da alteridade, implica uma problematização sobre a concepção etnográfica da humanidade num momento e época dados que torna possível a problematização sobre os próprios limites da humanidade. A partir da diversidade de seres humanos, chega-se a pensar o ser humano "do mesmo modo que um outro". A antropologia, portanto, é uma ciência social do observado que busca manter-se "sempre à margem do desconhecido". É interessante notar que para ele o antropólogo devotado à "religião" da antropologia é alguém que se comunica mal com seu próprio grupo social, é uma personalidade voltada para o fora, para a condição estrangeira de um outro grupo que não o seu. É para a multiplicidade num território dado que a curiosidade do antropólogo se volta. Na antropologia, busca-se "o humanismo de um outro mundo, de um mundo que se dilatou, que trouxe de volta para o interior da humanidade coisas que até então estavam fora". Há uma convicção de fundo na antropologia de Lévi-Strauss, uma crença, admitida por ele enquanto tal, enquanto pressuposto, de que "as humanidades são a humanidade; e a humanidade são os selvagens". Sem multiplicidades selvagens, não haveria humanidade possível. São as humanidades possíveis que nos dão as condições do pensamento do humano.

Achar o ponto de desentendimento no encontro é o que produz efeito de pensamento

Segundo Rancière, o convite participar de um encontro reflexivo, "é preciso que o encontro ache seu ponto de desentendimento", sem o que não haveria "efeito de pensamento". O entendimento sobre o desentendimento necessário ao encontro, enquanto forma de pensamento reflexivo, parte da ideia de que o desentendimento é "um tipo determinado de situação de palavra: aquela em que um dos interlocutores ao mesmo tempo entende e não entende o que diz o outro" (p.11). Todavia, desentendimento não é desconhecimento e muito menos mal-entendido. "Os casos de desentendimento são aqueles em que a disputa sobre o que quer dizer falar constitui a própria racionalidade da situação de palavra" (p.12), "o desentendimento se refere ao que é ser um ser que se serve da palavra para discutir" (p.13). A racionalidade própria da política é a racionalidade do desentendimento. A política é uma atividade cuja racionalidade própria é a racionalidade do desentendimento. A concepção do humano e do não-humano estão na base desse recorte político.

quarta-feira, 5 de junho de 2013

POR UM NOVO REGIME DA DESCRIÇÃO ETNOGRÁFICA

O esforço coletivo de busca por um novo regime de descrições no âmbito da produção do conhecimento etnográfico, tanto na antropologia quanto na sociologia, possui como ponto de partida um problema que é talvez o mais interessante para desencadear o debate sobre isso. A etnografia enquanto descrição de uma realidade coletiva parte, classicamente, do pressuposto de que a realidade a ser descrita preexiste à ação científica de descrevê-la. Se não houvesse uma realidade preexistente, não haveria descrição. Ocorre que a descrição etnográfica, enquanto conduta teoricamente orientada, não pode esquecer que a tarefa principal é a explicitação do que está pressuposto de modo implícito, ocultando o trabalho que a "entidade" efetua para se atualizar enquanto uma sistema de delimitação empírico dado. Ou seja, a descrição etnográfica precisa adotar como princípio a dispersão daquilo que garante a objetividade da entidade a ser descrita. Por isso, no sentido pós-estruturalista da teoria social contemporânea, a descrição etnográfica é um tipo de ficção controlada, pois nem a ciência, nem a arte, estão na descrição da realidade imbuídas de designar a verdade como correspondência realista entre pensamento e mundo social, a verdade é uma critério válido para a prática que a institui como critério de sua própria verdade, a observação não é externa, no limite, não há sequer observação, mas criação de limites possíveis, de um "etno" menor, naquilo que há de impensável para a doxa nativa e que a própria paradoxa nativa, ao implicar o pesquisador enquanto situação de campo, se oferece para a explicitação das relações sociais que produzem as descrições etnográficas como descrições intensivas.