sábado, 20 de dezembro de 2014

A conversação e a atitude etnográfica

Conversar é a atividade que, a meu ver, está no cerne do método etnográfico. A conversação com os outros, com pessoas concretas, pessoas que nomeiam a si mesmas. O ponto de partida, portanto, é escutar o modo como as pessoas se nomeiam. Depois da nomeação de si, a nomeação de parentes, amigos e inimigos, a nomeação das terras, dos territórios e, principalmente, das fronteiras, do estrangeiro, e do desconhecido. A nomeação das coisas do mundo, das coisas sagradas, das coisas em uso, a nomeação dos usos. A nomeação do universo. Os atos de nomeação escutados no contexto de conversação, acompanhados dos gestos, das expressões, do movimento do corpo, é adotar o ponto de vista segundo o qual a pessoa é um microcosmos da vida coletiva. O detalhe mais recente na compreensão desse método está ligado ao deslocamento do olhar, do ver, para o escutar, o ouvir. Escutar as palavras que saem da fala do outro, escutar os silêncios que configuram a fala dos outros. Escutar é um modo de agir compreensivo. É a forma compreensiva por excelência. Sem escuta do sentido da fala do outro, não há compreensão prática mútua e muito menos compreensão antropológica da produção da diferença, que é a tarefa primeira e última da antropologia. Afinal, a diferença não é uma coisa, não é um bem, ela se relaciona com coisas e produz bens, mas a diferença mesma não é nenhuma coisa, nenhum bem. A diferença é uma relação. Conexão, relação e orientação para o fora e para o dentro. Trata-se de ou buscar no fora ou no dentro, geralmente, em ambos, as capacidades agentivas do viver de outro modo que não seja o modo alheio que se se impõe sem processos de conversação, sem escuta.